segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

Petição pública atinge 790 assinaturas! A meta é passar das 1.000 até o Natal


Às 15h17 minutos da segunda-feira, dia 17 de dezembro de 2012, o nosso abaixo-assinado pedindo ao governador Agnelo Queiroz o cancelamento da PPP dos resíduos sólidos do Distrito Federal, registrado na página http://www.peticaopublica.com.br, já havia chegado às 790 assinaturas!

A nossa meta é passar das mil assinaturas até o dia do Natal. Queremos sensibilizar e convencer o governador Agnelo Queiroz de que essa PPP bilionária contraria o interesse público e desmoraliza o atual governo. O Distrito Federal merece um grande presente neste final de ano: o cancelamento dessa PPP bilionária e a convocação de uma conferência distrital para a construção do Plano de Saneamento Básico mais democrático do Brasil.

Participe desta luta! Assine o abaixo-assinado, que está disponível no seguinte endereço:

http://www.peticaopublica.com.br/PeticaoVer.aspx?pi=P2012N32157


Excelentíssimo Sr.
Agnelo Queiroz
Governador do Distrito Federal,

Informado(a) das ilegalidades e da completa inadequação da contratação por meio de PPP da totalidade dos serviços públicos que integram a limpeza urbana e o manejo de resíduos sólidos do DF durante 30 anos com uma só empresa; consciente de que a gestão dos resíduos sólidos do DF deve ser planejada de modo democrático e participativo, como prevê a Lei Federal 12.305, devendo ser executada com a participação de cooperativas de catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis; e consciente de que o SLU precisa ser capacitado para coordenar os programas e ações respectivos; visando a que se evite o monopólio e a elevação desnecessária dos custos desses serviços públicos que, em última instância, são pagos pela população; esperando que Vossa Excelência lidere um governo transparente e participativo e garanta o mínimo de controle social sobre um serviço público essencial, peço a Vossa Excelência que:

a) Determine o cancelamento da PPP da Gestão dos Resíduos Sólidos no DF;

b) Convoque, nos termos da Lei 12.305, a elaboração do Plano de Gestão Integrada dos Resíduos Sólidos do DF, de forma democrática e participativa;

c) Providencie o encerramento do Lixão da Estrutural, implantando urgentemente o aterro sanitário Oeste, assegurando condições de trabalho dignas e remuneradas na reciclagem dos produtos da coleta seletiva aos catadores de material reciclado do DF;

d) Mande reestruturar e modernizar o Serviço de Limpeza Pública (SLU-DF), realizando concurso público e capacitando-o técnica e institucionalmente para a gestão moderna e eficiente dos resíduos sólidos do DF.

Atenciosamente,

Os signatários

terça-feira, 11 de dezembro de 2012

PPP do absurdo


PPP do lixo de Brasília, absurdo sem tamanho

A proposta dobra o custo atual dos serviços e o governo do Distrito Federal abre mão de recorrer ao Judiciário brasileiro para resolver divergências com o parceiro privado

Antônio Carlos Queiroz*

(Artigo originalmente escrito para a edição 20 da revista meiaum (www.meiaum.com.br))

A audiência pública de 12 de novembro, convocada pelo GDF para discussão da PPP do lixo, já estava chegando ao fim quando tomou a palavra o regulador de serviços públicos Silvo Góis de Alcântara. Ele iniciou a fala esclarecendo que estava ali na condição de técnico, não de político, precavendo-se contra a infeliz observação do secretário executivo do Conselho Gestor das PPP, Márcio Galvão, que havia acusado alguns dos oradores de “tentar transformar a audiência em palanque”.

Silvo se apresentou como servidor concursado da Agência Reguladora de Águas, Energia e Saneamento Básico do Distrito Federal (Adasa) e passou a desfiar várias impropriedades na proposta da PPP, a começar pelo fato de não atender nenhuma das principais exigências do artigo 11 da Lei 11.445/2007, a saber: a existência de um plano de saneamento básico; a existência de estudo comprovando a viabilidade técnica e econômico-financeira da prestação universal e integral dos serviços, nos termos do respectivo plano de saneamento básico; e a existência de normas de regulação que prevejam os meios para o cumprimento das diretrizes da Lei 11.445, incluindo a designação da entidade de regulação e de fiscalização. Sem cumprir essas exigências, não é válido nenhum contrato que tenha por objeto a prestação de serviços públicos de saneamento básico, diz a lei.

Um detalhe chamou a atenção na figura esguia de Silvo: uma longa bengala branca, indicando que ele é portador de deficiência visual. A partir desse detalhe este repórter cunhou uma frase de efeito, que, mesmo correndo o risco de parecer politicamente incorreta, pode ajudar a entender o absurdo que envolve a proposta da PPP do lixo: “Só não vê quem não quer”!

O pior cego - Mais tarde, o próprio Silvo achou graça na brincadeira, e a conversa acabou se desviando para um assunto teológico. Dentre os milagres de Jesus Cristo, as curas dos cegos indicaram justamente a necessidade da busca pela verdade, daí saindo o corolário de que “o pior cego é aquele que não quer ver”. Será que o governador Agnelo Queiroz está nesta situação? E por que, mesmo diante de tantas impropriedades e indícios de malfeitos, e com tanta gente contra, o governador insiste no processo de contratação da PPP do lixo? Será que ele quer que o povo do Distrito Federal abra mão dos princípios republicanos e adote o mote de um dos primeiros padres da Igreja, Tertuliano de Cartago (160-220 dC) “Credo cuia absurdum” – “Creio porque é absurdo”? Uma frase doutrinária que estabelecia dois princípios para o comportamento dos “bons” cristãos: a fé como base do conhecimento, e a autoridade como supremo critério da verdade.

Neste momento, sem que se saiba o índice de sua popularidade, não é possível analisar o grau de autoridade ou legitimidade do governador. Mas pode-se discutir o evangelho em que se baseia a PPP dos resíduos sólidos do Distrito Federal, com o nome do santo e as circunstâncias em que ele o escreveu: trata-se do prefeito eleito de São Paulo, Fernando Haddad, na condição de assessor do então ministro do Planejamento, Guido Mantega, no biênio 2003 e 2004.

Sacra escritura  - Uma síntese do texto sagrado de Haddad, defendida pelo governo Dilma como alternativa à privatização selvagem do governo FHC, pode ser acessada no link da nota 6 de sua biografia na Wikipédia. É o discurso que ele proferiu no dia 13 de dezembro de 2003, durante o Seminário Internacional Parceria Público-Privada na Prestação de Serviços de Infra-Estrutura, promovido pelo Ministério das Relações Exteriores, o Banco Interamericano de Desenvolvimento e o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social a nota n° 6 da biografia de Haddad na Wikipédia.

Ali se lê que as PPP seriam “rigorosamente” neutras em relação à questão da privatização versus estatização. “Ela (a lei das PPP) não se insere dentro deste contexto”. Curiosamente, o exemplo que ele cita nesse debate é o dos serviços de saneamento básico, admitindo que “há um movimento nacional bem organizado, legítimo nas suas pretensões”, que luta por manter o saneamento no âmbito público”. Mas adverte:

A lei, em primeiro lugar, não obriga a contratação e, em segundo lugar, muito menos a concessão do serviço público. Mas mais do que isso, eu gostaria de sublinhar que a lei de parcerias, de certa forma, pode ser vista como um caminho que admite a participação do setor privado em novas áreas de investimento em infra-estrutura, mas que também recupera a capacidade de investimento das concessionárias públicas. A concessionária pública que, hoje, não tem condição de contratar à maneira antiga da 8666, terá condição de se planejar melhor e alavancar investimentos e se valer deste instrumento.

A principal justificativa das PPP, portanto, tal como está descrito na apresentação das características da PPP do lixo do Distrito Federal, seria a alternativa de alavancar investimentos que as concessionárias públicas não têm condições de fazer ou que, supostamente, já não podem fazer nos termos da Lei de Licitações Pública (Lei n° 8.666). Aprofundando a justificativa, Haddad diz:

“Ao invés de aumentar a carga tributária para realizar uma obra que vai ser utilizada por gerações, eu diluo a remuneração dos serviços prestados por aquela obra ao longo da sua utilização, que pode ser de 30 anos, de 25 anos, de 20 anos. Então, é até mais justo, do ponto de vista do ônus que representa para a sociedade, um investimento de porte. Essa mudança, que é o que nós chamamos de PPP, escapa do conceito de privatização ou estatização: ela tanto permite que se promova novas rodadas de concessão, para o setor privado, como ela admite uma nova modalidade de contratação pelo setor público, ou por concessionárias públicas”.

Opiniões e privatizações - O documento não dá elementos diretos, mas é provável que de sua discussão é que se extraiu a ideia de que as “privatizações de Lula e Dilma” seriam radicalmente diferentes das “privatizações de FHC”. Entregar o serviço público à gestão privada por 20 ou 30 anos, de acordo com esse pensamento, não seria privatização. Privatização seria tão-somente a alienação, a venda do patrimônio público. Parece óbvio que essa leitura está contaminada por uma espécie de fetichismo que, a ser verdadeiro, obrigaria os economistas a reescrever a história do capitalismo, descartando o arrendamento como forma de apropriação privada dos meios de produção.

O argumento de Haddad que as PPP se justificam para suprir a incapacidade de investimentos por parte das concessionárias públicas (por diversas razões, incluindo os limites da Lei de Responsabilidade Fiscal) poderia até ser aceito em determinadas circunstâncias, em nome do interesse público. O interessante, segundo informa o economista Carlos Gomes, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), é que o governo federal não fechou, até agora, nem uma PPP. Todas as concessões federais firmadas foram feitas nas modalidades mais simples, previstas na Lei 8.987/95, que dispõe sobre o regime de concessão e permissão da prestação de serviços públicos. De qualquer forma, a razão levantada por Haddad está longe de se verificar no caso da PPP do lixo do Distrito Federal.
No elenco das características do projeto, divulgadas na página da Internet da Secretaria de Governo, está dito que “a execução dos serviços de coleta e disposição final dos resíduos sólidos urbanos é de responsabilidade dos administradores do GDF”. “Contudo, prossegue o texto, “as administrações do GDF deparam-se com a escassez de recursos para investir no setor, obstáculo que dificulta a prestação de serviços de qualidade para a população, além de onerar, sobremaneira, as contas públicas”. A falta de recursos para investimento no setor, portanto, seria o principal motivo para a busca da parceria com a iniciativa privada. Mas o que esta alegação tem de verdade?
Os custos atuais - O GDF não divulga, mas meiaum teve acesso a uma planilha do Serviço de Limpeza Urbana (SLU), segundo a qual os gastos do governo com a prestação desses serviços orçam hoje em torno de R$ 190 milhões por ano. O projeto da PPP prevê mais que dobrar esses gastos anuais, sem demonstrar tal necessidade em nenhum dos documentos até agora divulgados. A modelagem econômico-financeira apresentada pela Companhia Paulista de Desenvolvimento (CPD) ao GDF, que dá base ao projeto, não traz dados básicos suficientes para a avaliação de custos, como o crescimento da população do Distrito Federal nos próximos 30 anos, prazo assumido para a execução do contrato. No lugar disso, traz um quadro da projeção da população brasileira até 2050. Ora, se o estudo não tem uma estimativa para o crescimento da população do Distrito Federal e, por consequência, dados sobre o aumento da produção local de lixo, como assumir que os gastos com o seu processamento deverão dobrar no período de execução do contrato? Em português simples, a proposta da PPP está baseada em chutes.
Na verdade, a proposta é bem pior do que só isso. Projeta gastos de mais de R$ 390 milhões por ano durante 30 anos, sem contar a prorrogação prevista de mais cinco anos, cujos reajustes também não estão previstos em qualquer fórmula na minuta do contrato. Os custos da PPP seriam então da ordem de R$ 11,7 bilhões durante 30 anos. Em contrapartida, o custo estimado dos investimentos nesse período seria de R$ 762 milhões. Parece muito, mas corresponde a pouco mais de 6% dos gastos com a contraprestação dos serviços no período.
Do ponto de vista econômico esse negócio é ótimo apenas para a empresa privada que vier a ganhar a licitação. Do ponto de vista do interesse público, o negócio não faz o menor sentido. Dobrar os gastos atuais, sem qualquer garantia de dobrar a qualidade dos serviços, não é um procedimento que se possa chamar de republicano, pelo menos não nos termos do artigo 37 da Constituição Federal, segundo o qual a administração pública obedecerá aos princípios de legalidade, moralidade, publicidade e eficiência.
Não é ocioso dizer que faz menos sentido ainda a alegação do GDF de que o atual sistema da limpeza urbana, que custa R$ 190 milhões por ano, “onera, sobremaneira, as contas públicas”. Dobrando esses custos, para que o advérbio “sobremaneira” da frase terá de ser substituído por outro, mais preciso, talvez “espantosamente” ou “terrivelmente”.  
SLU sucateado - Uma segunda justificativa do GDF para a adoção da PPP, sempre segundo a apresentação do projeto pela Secretaria de Governo, é que “a execução direta dos serviços pela administração do GDF é uma alternativa que há muito tempo não tem dado bons resultados. Não somente tem sobrecarregado a folha de pagamento da estrutura administrativa (especialmente os gastos com pessoal), como também tem gerado dificuldade em acompanhar a evolução técnica e os investimentos demandados pelos serviços”. O texto, porém, não explica a razão das deficiências do GDF, embora essa situação já fosse bem conhecida pelo governador Agnelo Queiroz ainda na época de sua campanha eleitoral. Tanto que ele se comprometeu a reestruturar o SLU para reverter o quadro, sem ter cumprido a promessa até o momento.
A engenheira sanitarista Kátia Campos, responsável pela reestruturação da Superintendência da Limpeza Urbana de Belo Horizonte na gestão e Patrus Ananias, nos anos 90, tem feito estudos sobre o SLU-DF para obter um mestrado no Centro de Desenvolvimento Sustentável da UnB. Ela constatou que o órgão está caindo aos pedaços, literalmente. “O SLU está todo ferrado. Tem apenas quatro técnicos de nível superior e o clima entre os seus servidores é de total desalento, sem perspectivas”. Segundo Kátia, não é correto simplesmente dizer que o poder público é incompetente para justificar a privatização de serviços de sua responsabilidade. Antes é preciso saber que medidas o governo tomou para equipar o prestador dos serviços com a capacidade necessária para regular, executar e fiscalizar os serviços. Em Belo Horizonte, ela diz que a orientação do prefeito Patrus Ananias foi “exatamente a oposta da adotada pelo Agnelo”. No debate realizado no PT-DF sobre o assunto, no dia 22 de novembro, uma pergunta sua feita ao secretário de Governo, Gustavo Ponce de León, ficou sem resposta: “A PPP veio justificada pelo sucateamento do SLU ou o sucateamento do SLU foi propositalmente mantido para justificar essa PPP?”.

Comédia de erros - Desde que foi convocada a primeira audiência pública para debater a PPP do lixo, todo o processo que precede a licitação da parceria tem sido um comédia de erros, como tem denunciado as instituições que assinaram o manifesto “A PPP bilionária dos resíduos sólidos não atende os interesses da população do Distrito Federal” e que organizaram um movimento para combatê-la.

A falta de transparência é a primeira característica da proposta. Além de não apresentar até agora os custos nas minutas do edital de licitação e do contrato, os estudos técnicos encomendados à Companhia Paulista de Desenvolvimento só foram publicados na página da Internet da Secretaria de Governo depois da frustrada tentativa de realização da primeira audiência pública, no dia 10 de outubro, na Sala Alberto Nepomuceno do Teatro Nacional, conforme noticiado na última edição de meiaum.

É curioso e, mais do que isso, altamente suspeito, pelos interesses políticos e econômicos que possam estar sendo escamoteados, que a imprensa local, com as exceções de praxe, não publique nada sobre o assunto. Não entrou na pauta da mídia nem o fechamento do lixão da Estrutural durante dez dias pelos catadores de materiais recicláveis, em protesto contra a PPP, nem os pronunciamentos sobre o assunto do deputado distrital Joe Valle (PSB), do deputado federal Reguffe, da deputada Érika Kokay (PT), dos senadores Cristovam Buarque (PDT) e Rodrigo Rollemberg (PSB).

Imprensa calada - A imprensa calou sobre a primeira audiência pública, que não houve, mas que atraiu mais de mil interessados, a maioria de catadores, que fez uma caminhada à luz do dia entre o Teatro Nacional e o Buriti. E emudeceu sobre a segunda audiência pública, do dia 12 de novembro, que também mobilizou mais de mil pessoas, que dessa vez lotaram o amplo auditório do Museu Nacional da República. Por que o silêncio? Os serviços de limpeza urbana não seriam um assunto de interesse jornalístico?

Não tem interesse jornalístico discutir se o GDF quer ou não quer adotar a incineração para tratar o lixo de Brasília? Com os protestos dos catadores e as denúncias dos ambientalistas, o secretário de Governo, Gustavo Ponce de León informou na segunda audiência pública e repetiu no encontro promovido pelo PT que essa alternativa está definitivamente descartada. Mas se isso é verdade, por que o GDF não divulga os termos do convênio que o governador Agnelo Queiroz assinou na Alemanha com a empresa STEAG no dia 24 de julho último?

Lê-se no site da Agência Reguladora de Águas, Energia e Saneamento Básico do Distrito Federal (Adasa) que essa empresa “é uma das maiores especialistas em resíduos sólidos e geração de energia, para viabilizar estudos sobre a destinação dos resíduos sólidos do DF e também como usá-los para a produção de energia em usinas térmicas”. O presidente da Adasa, Vinicius Benevides, afirmou na ocasião que “os técnicos do DF estão analisando a viabilidade do aproveitamento dos resíduos para a produção de energia térmica. O protocolo assinado, salientou, é de grande importância para o tratamento dos resíduos sólidos do futuro aterro sanitário que iremos construir, pois poderemos contar com a experiência técnica mais avançada do mundo”.

Empresas interessadas - Enquanto o GDF não esclarecer de maneira cabal a questão da incineração, as dúvidas continuarão de pé. Uma fonte ouvida por este repórter garante que já identificou duas empresas interessadas em participar da licitação da PPP do lixo de Brasília. Uma delas, a Foxx, do empresário carioca Milton Pilão Júnior, com sede no Rio, assinou, no final de 2011 uma PPP com a cidade de Barueri, São Paulo, para instalar uma usina de geração de energia com capacidade de processar 825 toneladas de lixo por dia. A outra empresa seria a Marquise, de Fortaleza, Ceará, que, segundo o jornal Valor Econômico de 9 de julho, está associada com a Foxx numa PPP firmada com o município de Osasco, São Paulo, também para gerar energia a partir do lixo. Segundo o Valor de 11 de outubro, a Foxx “tem planos ousados de expansão no setor de saneamento, especificamente na área de geração de energia via tratamento térmico de resíduos, na qual projeta investimentos de R$ 3,2 bilhões em cinco anos”.

Nos termos da modelagem apresentada pela Companhia Paulista de Desenvolvimento para a PPP do lixo do DF, as empresas interessadas nem precisariam de muito dinheiro para entrar no negócio. Cálculos feitos pelo engenheiro sanitarista Marcos Montenegro, da superintendência dos resíduos sólidos da Adasa, demonstram que, no cenário 1 da proposta, bastaria que a firma contratada levantasse algo em torno de R$ 60 milhões de reais para cobrir o saldo negativo de caixa no primeiro ano de operação, e mais R$ 30 milhões para cobrir o déficit de caixa dos dois primeiros anos da operação. No primeiro ano haveria déficit porque a empresa teria de fazer o principal aporte (coisa de 20%) dos investimentos previstos para os 30 anos do contrato, R$ 153 milhões de um total de R$ 770 milhões. ) (*). Nos 29 anos seguintes, somente haveria saldo negativo, devido aos picos de investimentos decorrentes da necessidade de trocar os equipamentos, no 2°, 11°, 16°, 21° e 26° anos. Porém, tirante o primeiro e segundo ano, nos demais nem haveria saldos negativos de caixa, que seriam cobertos com o saldo acumulado.  

 

Cenário 1 - Fluxo de caixa resumido (antes dos impostos com ISS)
Ano
Período
Investimentos
Despesas de Exploração
Total Custos
Receitas
ISS
Saldo
Saldo acumulado
Total

770.797
9.306.462
10.077.259
11.709.690
585.485
1.046.947
1.046.947
2013
Ano 1
153.032
280.708
433.740
 390.323
19.516
-62.933
-62.933
2014
Ano 2
51.023
286.062
337.085
 390.323
19.516
33.722
-29.211
2015
Ano 3
16.257
292.223
308.480
 390.323
19.516
62.327
33.116
2016
Ano 4
13.968
292.172
306.140
 390.323
19.516
64.667
97.782
2017
Ano 5
216
294.007
294.223
 390.323
19.516
76.584
174.366
2018
Ano 6
73.651
295.777
369.428
 390.323
19.516
1.379
175.745
2019
Ano 7
6.691
296.489
303.180
 390.323
19.516
67.627
243.372
2020
Ano 8
242
298.147
298.389
 390.323
19.516
72.418
315.790
2021
Ano 9
252
299.755
300.007
 390.323
19.516
70.800
386.590
2022
Ano 10
48.502
300.314
348.816
 390.323
19.516
21.991
408.581
2023
Ano 11
112.073
306.823
418.896
 390.323
19.516
-48.089
360.491
2024
Ano 12
2.988
308.277
311.265
 390.323
19.516
59.542
420.033
2025
Ano 13
4.260
309.672
313.932
 390.323
19.516
56.875
476.908
2026
Ano 14
319
311.003
311.322
 390.323
19.516
59.485
536.393
2027
Ano 15
337
312.262
312.599
 390.323
19.516
58.208
594.601
2028
Ano 16
81.653
313.443
395.096
 390.323
19.516
-24.289
570.312
2029
Ano 17
3.136
314.537
317.673
 390.323
19.516
53.134
623.445
2030
Ano 18
405
315.545
315.950
 390.323
19.516
54.857
678.302
2031
Ano 19
4.484
316.459
320.943
 390.323
19.516
49.864
728.166
2032
Ano 20
5.477
317.276
322.753
 390.323
19.516
48.054
776.220
2033
Ano 21
78.992
322.990
401.982
 390.323
19.516
-31.175
745.045
2034
Ano 22
7.428
323.601
331.029
 390.323
19.516
39.778
784.823
2035
Ano 23
611
324.112
324.723
 390.323
19.516
46.084
830.907
2036
Ano 24
680
324.523
325.203
 390.323
19.516
45.604
876.510
2037
Ano 25
4.863
324.833
329.696
 390.323
19.516
41.111
917.621
2038
Ano 26
79.905
325.044
404.949
 390.323
19.516
-34.142
883.479
2039
Ano 27
3.844
325.159
329.003
 390.323
19.516
41.804
925.283
2040
Ano 28
5.355
325.180
330.535
 390.323
19.516
40.272
965.555
2041
Ano 29
1.598
325.113
326.711
 390.323
19.516
44.096
1.009.651
2042
Ano 30
8.555
324.956
333.511
 390.323
19.516
37.296
1.046.947
(*) Há uma pequena diferença entre os números trabalhados por Montenegro e os da apresentação no site da Secretaria de Governo. No site, está dito que os investimentos totais serão de R$762 milhões. Com base nos números constantes das tabelas extraídas da Avaliação Econômico-Financeira, porém, Montenegro chegou ao montante de R$ 770,7 milhões.

Depreciação em cinco anos - No estudo realizado por Montenegro, os picos dos investimentos verificados nos seis anos mencionados evidenciam um dos maiores gargalos dessa proposta de PPP: a de que estarão sendo concedidos por 30 anos seguidos serviços tipicamente  executados por meio de contratos de terceirização por cinco anos. Esses contratos têm essa validade porque ela coincide com o prazo de depreciação dos equipamentos, como os caminhões de coleta de lixo. No final desses contratos, vale a pena fazer outra licitação não apenas para garantir a troca dos equipamentos velhos por mais novos, mas também para garantir a oferta de tecnologias inovadoras.

Um outro quadro montado por Montenegro mostra que 48% dos serviços previstos na contratação da PPP são desse tipo: varrição (mecânica e manual); serviços complementares de limpeza (como lavagem de monumentos), coleta dos resíduos domiciliares e coleta seletiva. Entregar esses serviços a um monopólio privado por 30 anos só pode ser chamado de disparate, prevendo-se, como um dos efeitos danosos do negócio, o enorme poder que essa empresa terá sobre os administradores do Distrito Federal.


INVESTIMENTOS – CENÁRIO 1
Cenário 1 (com varrição manual e mecânica)
Mil R$
%
Varrição (mecânica/manual)
 45.705
6%
Serviços complementares de limpeza
 78.074
10%
Coleta dos Resíduos Domiciliares
 189.965
25%
Coleta Seletiva
 57.337
7%
Subtotal 1
371.081
48%
Sedes operacionais
 19.349
3%
Usinas de Compostagem
9.640
1%
Tratamento de resíduos de serviços de saúde
93.278
12%
Transferência/ Transbordo
 62.353
8%
Aterros Sanitários
 174.096
23%
Remediação do Lixão da Estrutural
 41.000
5%
Subtotal 2
399.716
52%
Total
 770.797
100%

Cadê as respostas? - Muitos outros aspectos dessa PPP precisam ser ainda esclarecidos, entre os quais os papel reservado para os quatro mil catadores de catadores de materiais recicláveis que trabalham no Distrito Federal. Na segunda audiência pública, dezenas de perguntas foram formuladas ao secretário de Governo, e aguardam respostas. Um pedido de informações e documentos, com base na Lei de Acesso à Informação (Lei 12.527/2011) também foi encaminhado ao GDF por uma dúzia de cidadãos para aferir se a proposta viola, como parece evidente, os princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência. A depender das respostas, os administradores do GDF serão acionados em Ação Popular com o objetivo de apurar se estão cometendo atos de improbidade.

Também está correndo na Internet uma petição pública que pede ao governador Agnelo Queiroz o cancelamento da PPP; a convocação, nos termos da Lei 12.305, a elaboração do Plano de Gestão Integrada dos Resíduos Sólidos do DF, de forma democrática e participativa; o encerramento do Lixão da Estrutural, implantando urgentemente o aterro sanitário Oeste, para assegurar condições de trabalho dignas e remuneradas ao catadores de material reciclável; e a reestruturação e modernização do SLU-DF, com a realização de concurso público. Tudo isso de acordo com os compromissos de campanha do governador.

Justiça do Brasil descartada - Como já foi dito, a proposta da PPP do lixo do Distrito Federal é tão absurda que qualquer cidadão disposto a apoiá-la tem que ter ou fé ou respeito absoluto à palavra de uma autoridade. Pode parecer brincadeira, mas essa proposta é tão absurda que, nos termos da minuta do contrato de 10 de outubro de 2012, disponível na paginada Internet da Secretaria de Governo, o GDF abrirá mão de recorrer à Justiça brasileira para dirimir as controvérsias que vierem a surgir na execução do contrato. Um Tribunal Arbitral, a ser constituído por membros nomeados pelas duas partes, com base nas regras de procedimentos do Comitê de Mediação e Arbitragem da Câmara de Comércio Brasil-Canadá, é que ficará encarregado de julgar as controvérsias. 

Nos termos da cláusula três do artigo 48, o recurso ao Judiciário poderá gerar até mesmo multas para a parte que “violar” essa disposição. Nos termos da cláusula 48.5 só caberá ao Judiciário do Brasil só caberá julgar “as controvérsias referentes à interpretação, alteração, aplicação e  cumprimento do Regulamento da Concessão (...), por se referirem a direitos indisponíveis. Porém, segundo o item primeiro dessa cláusula, “as consequências de natureza econômicas advindas das controvérsias referidas neste item 48.5 serão  tratadas no âmbito do procedimento arbitral, por se referirem a direitos patrimoniais disponíveis”.

Falando em juridiquês, no caso do contrato em discussão, o GDF abriria mão de seu “poder extroverso” – a prerrogativa de definir obrigações para terceiros (por exemplo, regulamentar, fiscalizar, fomentar etc) – para ficar em condições de igualdade na relação com o parceiro privado. Mas até que ponto isso pode ser aceito, em se tratando de serviços essenciais, de notório interesse público, como a coleta e o tratamento de lixo?

Essa é uma questão relevante tanto para um debate jurídico quanto para um debate político, sobre o papel do Estado. Jeová Pereira, diretor do Sindicato dos Urbanitários do DF, durante o debate promovido pelo PT no dia 22 de novembro, deu o mote: “Em todo o Brasil, os governadores e prefeitos estão fazendo PPP para tudo, educação, saúde, energia elétrica, habitação, lixo, centros de administração. E dizem que PPP não é privatização. Se não é privatização, é terceirização. Daqui a pouco os governos não vão ter mais nenhum papel, porque vão terceirizar os mandatos dos prefeitos, governadores, deputados. O cara vai contratar uma firma e dizer: ‘Ó, cuida do meu mandato aí!’”. 
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* Antônio Carlos Queiroz é jornalista, tendo sido secretário adjunto de Comunicação Social do governo Cristovam Buarque e membro do Conselho Administrativo da Companhia de Saneamento Ambiental do Distrito Federal (Caesb), entre 1995 e 1998